O PROBLEMA DOS VOTOS ALEGRE
"O problema dos votos de Alegre é que eles se podem somar a parte dos votos de Cavaco Silva. O Presidente eleito, na sua campanha milimetricamente delineada para vencer à primeira volta, também tocou a tecla, perigosa, da rejeição da política e também se demarcou dos partidos. Do seu próprio partido, que é, desde 1975 e com o PS, o esteio da democracia liberal contra as tentações populistas, regeneradoras, moralizadoras, autoritárias que habitam o fundo da nossa cultura política. Vimos ressuscitados os velhos rostos de Eanes e de outros eanistas, militares e civis, que pensávamos definitivamente arrumados no passado, integrar a sua comissão de honra. A mesma crise voltou a alimentar a mesma crença atrasada e irracional num salvador da pátria, que vem para pôr a coisas na ordem, a antítese da responsabilidade e da responsabilização democrática de cidadãos livres. Os partidos melhoram-se por dentro e o sistema democrático melhora-se a si próprio, com leis e com práticas reformistas. Não com discursos regeneradores, populistas ou com silêncios que, mesmo que sejam tácticos, são sempre perigosos na medida em que alimentam falsas ilusões. Ligou-se pouco a este lado do sentimento nacional expresso no voto. É este o lado mais preocupante da derrota de Mário Soares, o único candidato que disse e repetiu incansavelmente, numa campanha que foi uma lição de vida, que a política é a mais nobre das profissões e que não há democracia que não assente em partidos políticos. Que, como sempre, nunca caiu em tentação. Se somarmos a ausência de debate político - nenhuma das grandes questões internacionais que condicionam as nossas opções e o nosso futuro esteve presente na campanha, nenhum dos grandes debates que abalam as democracias europeus foi feito a sério nesta campanha -, resta-nos um quadro que, em situação de crise e de desesperança, só pode ser negativo". Teresa de Sousa, Público. (Sublinhados meus.)
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