terça-feira, 21 de novembro de 2006

CITAÇÕES.

Extractos de A gazela que corre mais depressa que os elefantes, de Teresa de Sousa, hoje no Público:
1. (Ségolène Royal) Venceu contra o aparelho do seu partido. Praticamente sozinha. Contra Lionel Jospin, que saiu da reserva a que se remeteu depois da derrota de 2002, quando perdeu para Jean-Marie le Pen na primeira volta das presidenciais, apenas para tentar impedir a sua ascensão. Sem o apoio, sequer implícito, das figuras históricas do socialismo francês, de Michel Roccard a Jacques Delors. Contra o oportunismo impensável de Laurent Fabius, convertido à ala esquerda do PS, depois de ter sido em tempos a sua ala direita e de ter liderado a campanha do "não" à Constituição europeia. Contra o rigor tecnocrático de Dominique Strauss-Kahn. Contra Martine Aubry ou Jack Lang. Venceu contra a arrogância dos velhos senhores de Matignon ou de Bercy, que pensavam arrasá-la nos debates, puxando pelos galões da sua vasta e infinita sabedoria sobre Finanças e Negócios Estrangeiros. O que disse, afinal, Royal para vencer tão facilmente o aparelho do PS francês, arrebatar as primárias e conseguir manter-se persistentemente, teimosamente, à frente de qualquer sondagem? 2. Sabe-se que não teme encarar de frente as questões da segurança que hoje estão no centro da preocupação dos franceses. Que recomenda o serviço cívico obrigatório no exército para os jovens delinquentes. Que não teme falar de temas que são tabu para a esquerda, como a família ou a disciplina. Que diz ser um erro não prestar atenção ao que Tony Blair fez no Reino Unido, que muitas das suas reformas tiveram bons resultados, e que ele teve pelo menos a coragem de enfrentar os problemas novos e procurar para eles novas soluções. Que admitiu rever a lei das 35 horas, emblema da esquerda francesa, pela simples razão de que pode ter sido prejudicial para os mais fracos e apenas vantajosa para as empresas e para os mais qualificados. Que defendeu mais liberdade para os pais escolherem a escola onde querem matricular os seus filhos. Que diz e insiste que é preciso ouvir as pessoas e levar em conta as suas reais aspirações em vez de repetir slogans ou enunciar belos desígnios. Pode parecer muito pouco e, em boa medida, ainda não é suficiente para se saber o que Ségolène defende e pensa realmente. Mas são pequenas coisas que têm pelo menos o mérito de ir todas no mesmo sentido: quebrar o dogma, aceitar a mudança e encontrar soluções pragmáticas, não ideológicas, para resolver os problemas reais. 3. A gazela mostrou que pode correr muito mais do que os elefantes porque é diferente, porque é bonita, porque é mulher, porque ousa romper a teia de velhos lugares-comuns em que se enredou a elite política francesa e porque as sondagens indicam que pode ganhar. Mas é agora que o verdadeiro combate vai começar. Se a direita chiraquiana não conseguir torpedear a candidatura de Nicolas Sarkozy - coisa que ainda não é certa -, a bela dama de Poitou-Charentes que fascinou o PS terá de se confrontar com um adversário que também sabe o que quer. O seu discurso das pequenas coisas deixará de ser suficiente, bem como a forma como conseguiu iludir as grandes questões incómodas da economia, da Europa ou da globalização. Terá de fazer muito mais. Mas isso não impede que Ségolène Royal seja já hoje uma lufada de ar fresco no debate político em França.

Sem comentários: