terça-feira, 10 de abril de 2007

Arder em fogo lento

Votei nas últimas legislativas no Partido Socialista e, consequentemente, em José Sócrates para primeiro-ministro. Não votei por ele ser engenheiro técnico civil, engenheiro ou licenciado em engenharia., como não votei por tal grau académico ter sido obtido na Universidade Clássica, na Católica ou na Moderna. Votei porque era a única alternativa ao PSD/CDS-PP – um pântano político representado por Santana Lopes e Paulo Portas, depois da fuga de Durão, os quais deixaram o país à beira de um ataque de nervos e, pior, à beira da miséria. Ao votar como votei encontrei-me no resultado eleitoral com a esmagadora maioria dos portugueses. Nestes 2 anos de governação, no essencial, José Sócrates, enquanto primeiro-ministro, não gorou as minhas expectativas. Sem me alongar, direi que ficou aquém do que o país precisa em matéria de reformas, mas em dois anos não era exigível que se desatassem os nós atados durante quase trinta anos. Quanto ao seu estilo pessoal arrumo na prateleira do acessório. Há três semanas caiu-lhe, passe as distâncias, uma Monica Levinsky Blowjob na sopa. Neste momento, sob a batuta de José Manuel Fernandes (e ele sabe como estas coisas se urdem porque aprendeu enquanto novo), director de uma espécie de jornal de referência, discute-se em Portugal, a propósito do grau académico do primeiro-ministro, qualquer coisa como o que se discutiu há uns anos nos Estados Unidos: se o sexo oral será sexo ou não e se, por via de doutas interpretações, José Sócrates mentiu ou não. Neste momento, já não é possível dar explicações de pormenor sobre o que quer que seja: título académico, equivalências, professores das cadeiras e por aí fora, porque isso leva à humilhação, na medida em que, parece, José Manuel Fernandes apresentou o vestido com a nódoa. Já não se trata de saber se sexo oral é sexo ou não. No estado em que as coisas estão, José Sócrates só tem dois caminhos. Um, mais radical: apresenta a sua demissão e pede ao Presidente da República a convocação de eleições legislativas. Aí defrontará Marques Mendes e Paulo Portas e todos os Josés Manueis Fernandes que o querem ver arder em fogo lento. Se ganhar governa tranquilo, independentemente de maioria absoluta ou não. Este caminho tem custos para a economia e para os portugueses, mas maiores custos tem a permanência em exercício de um primeiro-ministro achincalhado; dois, a mais moderada, José Sócrates, explica o seu provincianismo, com simplicidade. A sua necessidade (quando veio do interior) de apresentar, num país medíocre e provinciano, um grau académico consentâneo com os cargos políticos e institucionais que desempenhava, usando o conceito popular (e não o rigor académico) de Engenheiro (em qualquer cidade de província qualquer engenheiro técnico é chamado engenheiro) e, consequentemente, pede desculpa aos portugueses por esse facto. Ao mesmo tempo, dá testemunho do seu empenho em, até ao fim do mandato, prosseguir as políticas e as reformas para tirar Portugal da miséria franciscana em que está atolado. Depois será julgado, em eleições democráticas, pelos resultados obtidos. Qualquer outro caminho debilitará a pessoa e o cargo que desempenha.

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