Nem tudo o que parece é, tal como nem tudo o que é parece.
A propósito deste post da Cristina lembrei-me de uma pequena história. Desde há 25 anos que, em Fevereiro, cumpro o ritual de visitar a Feira de Arte Contemporânea de Madrid. Aproveito sempre a ocasião para «passar os olhos» por outras exposições. Numa destas incursões, no final dos anos oitenta, entrei com o meu amigo Fernando no Rainha Sofia por volta da hora do almoço. Num dos pisos expunha-se a obra – pintura e instalações – de um norte-americano, cujo nome não me ocorre. Numa das salas, quase geometricamente ao centro, estava uma caixa de ferramentas, de tampa articulada, aberta. A caixa estava cheia de ferramentas. Junto à caixa, repousava um martelo, duas chaves de fendas e meia dúzias de buchas negligentemente espalhadas pelo chão. Dois casais, especados, observavam e comentavam a «obra de arte». O meu amigo hesitou: este gajo passou-se? – Interrogou-me, referindo-se ao artista. Durante meia dúzia de segundos lancei os olhos sobre as obras expostas, e respondi: - Isto não é nada. Ou é um incidente ou uma provocação. Palavras não eram ditas entrou pela sala um operário, de fato-macaco, recolheu a ferramenta espalhada pelo chão, fechou a caixa, pegou pela asa e retirou-se descontraidamente sem reparar na cara de parvos dos dois casais que procuravam disfarçar o embaraço da confusão. Na arte contemporânea nem tudo o que parece é, tal como nem tudo o que é parece.