||| Afinal, é este o país que temos. Os «tripés» são manobras de diversão.
«Na última edição publicámos a história de uma mulher francesa que, por um incrível azar, sofreu uma perda irreparável e um acidente brutal numa praia algarvia. Nesse dia do Verão de 1988, há quase 20 anos, Véronique perdeu o seu namorado, com quem tencionava casar, e ficou em coma. Recuperou, e ainda paraplégica, iniciou uma luta pela vida. Hoje anda com dificuldade, refez, tanto quanto se pode numa situação destas, a sua autonomia, mas nunca conseguiu ser indemnizada pelo Estado português.
E, no entanto, o Estado português foi condenado em todas as instâncias. A última vez foi no Supremo Tribunal Administrativo, a 19 de Dezembro de 2006, correndo agora um processo contra Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Segundo a nossa República fez saber ao advogado desta francesa, hoje com 51 anos, o Governo português não tem dinheiro para lhe pagar.
Trata-se de 370 mil euros. Um valor ridículo muito abaixo de algumas indemnizações ou reformas dadas a gestores públicos, ou do que verbas gastas em publicações, brochuras, propaganda que ninguém vê ou lê.
Não obstante, é um valor que não repara o imenso sofrimento de alguém que foi vítima da incúria de uma Câmara (como se deu por provado no processo).
Este Estado é desumano. Fala em grandes números, em grandes iniciativas, em grandes obras, mas não consegue honrar um dever a que um tribunal o condenou. Apregoa a modernização e o apego aos valores democráticos e humanistas, mas é incapaz de reconhecer um erro.
É este o Estado que temos. E o silêncio que reinou depois de conhecidos os factos é também bastante eloquente. Significa que tudo vai continuar na mesma.»
O Estado é desumano, Editorial do Expresso, 16.02.08.