Coligações de esquerda [2]
A primeira e única experiência de coligação de esquerda em Portugal com significado político concretizou-se a nível autárquico, e ganhou a Câmara de Lisboa, em Dezembro de 1989. Esta coligação assentou no entendimento entre o PS e o PCP, apesar de «arrastar» outros pequenos partidos (sobretudo aqueles que vieram a constituir o BE). Na altura, também se escreveu, e muito, o mesmo que André Freire agora repete a propósito do entendimento PS-BE na Câmara de Lisboa: «Mas podemos também olhar para esta coligação como um ensaio que, se correr bem, poderá eventualmente ser replicado ao nível do país.» A experiência da primeira coligação de esquerda, em Lisboa, não vai neste sentido. Aliás, a meu ver, o entendimento entre o PS e o PCP só foi possível, em primeiro lugar, por ser a nível autárquico; em segundo lugar, por ter apanhado o PCP num momento de completa desorientação estratégica e ideológica: Gorbachev tinha lançado, desde 1985, a «Glasnost» e a «Perestroika» minando os alicerces do modelo soviético e dos países de Leste, a que se juntavam as críticas e dissidências internas. O PCP, em silêncio, pagava a fidelidade canina ao PC da União Soviética e viu cair o muro de Berlim ainda antes das eleições autárquicas de 1989. Retomada a orientação estratégica nos finais dos anos 90, o que podemos constatar hoje é que o PCP não esteve politicamente disponível para se coligar, em Lisboa, com o PS e o BE. O que é significativo. E não é pelo alegado facto do PS estar no governo a executar uma política de «direita». Em 1997, a coligação de esquerda concorreu à câmara de Lisboa, numa altura em que o PS também executava uma política de «direita». O «grau de inovação nas fórmulas governativas» em Portugal, a que alude André Freire, provavelmente, não passa pelo PS, mas sim pelos partidos à sua «esquerda». Será o BE diferente do PCP?