quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

Abortemos, então.

Recebi alguns e-mail, uns de forma educada, outros de forma “terrorista”, uns identificados, outros anónimos, a questionarem a minha posição no referendo de 11 de Fevereiro, a propósito de aqui ter classificado como insensata uma determinada frase de Fernanda Câncio num texto de opinião publicado no DN. Prometi a cada um responder, e cumpro agora. Sobre o assunto recordo que Maria José Morgado disse, há pouco mais de um mês, numa “sessão de esclarecimento” promovida pelo Bloco de Esquerda, no Bairro Alto, uma coisa elementar: que a actual lei sobre interrupção da gravidez é mais permissiva do que a proposta a referendar. O João Gonçalves recentemente deu-se ao trabalho de transcrever integralmente o artigo 142º do Código Penal que, para quem não conheça, se recomenda a leitura. Aí se pode constatar outra coisa elementar: na lei penal vigente há situações em que o aborto é permitido até às 16 semanas nuns casos ou, mesmo até às 24 semanas, noutros. Mas essencialmente é permitido até às 12 semanas para “evitar grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida”. Isto significa que, no quadro da actual lei, bastava que se fixasse ao nível legal, clínico e jurisprudencial o conceito de “grave e duradoura lesão psíquica da mulher grávida” e, ao mesmo tempo, que se exigisse ao “estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido” que a lei fosse cumprida para que, no quadro da lei penal existente, se resolvessem os problemas que se pretendem resolver através do próximo referendo. Mas assim não aconteceu. Por isso, voto SIM no próximo referendo, como já escrevi anteriormente, apesar de considerar que: a) se pode vir a aprovar uma lei que tenha a mesma ineficácia que a actual; b) esta questão não é uma “batalha política”, muito menos de esquerda/direita; c) face à informação e aos meios disponíveis (contraceptivos e outros) a questão do aborto é hoje socialmente menos relevante que há 10, 15 ou 20 anos; d) respeito as convicções (éticas, morais, religiosas) de uma parte dos partidários do Não; e) abomino todos o que fazem desta questão uma “batalha política”, quer dos partidários do SIM, quer do Não.

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